Este é o Sr. Zé… que vive este coronavírus (e outros com um nome diferente) com o coração. Deixei-o em lágrimas… e eu não chorei na frente dele, mas chorei depois… Chorei pela sensação de impotência que situações como esta ou outras me provocam.
Quando comecei a ouvir falar do vírus, não dramatizei… afinal quem “manda” e tem mais informações que nós também fez questão de não o fazer…
Hoje as mesmas pessoas têm um discurso diferente e nós devemos desdramatizar quando o dizem e dramatizar a seguir também porque as mesmas pessoas o fazem.
As noticias, as redes sociais, um comunicado mal interpretado, um comentário infeliz e gera-se outro pandemónio (para mim o mais grave de todos) que é a facilidade com que nos permitimos acreditar em tudo, ofender com a liberdade de expressão do outro e ter tanta dificuldade em aceitar a desigualdade de opinião… quando é essa desigualdade que nos torna tão ricos e nos permite ser o que somos…seres únicos.
Julgar o desconhecido tornou-se fácil e confundimos muitas vezes direitos com faltas de respeito ao pisar um terreno que não é o nosso… muitas vezes à pedrada.
A Rugas de Sorrisos parou as visitas ao domicílio temporariamente e felizmente a maioria das pessoas que acompanha está salvaguardada.
De todas a que me custou mais foi o Sr. Zé…
Talvez por ser, como ele diz a única pessoa, para além do Senhor das tatuagens, a parar e a querer verdadeiramente saber…
Tive de deixar tudo alinhavado para uma semana e ele percebeu.
Antes de eu abrir a boca para dizer o que quer que fosse, já ele estava a chorar.
Expliquei-lhe que dadas as circunstancias e por precaução, era melhor parar uns dias, até a situação estar controlada. Que eu estava bem mas que não podia continuar a fingir que não estava a acontecer nada e que ele pertencia a um grupo de risco e eu ao ir lá sem querer, podia estar a coloca-lo em perigo.
A resposta do Sr. Zé foi esta:
“ Eu já sabia pela quantidade de coisas que trouxeste hoje e que não precisava. Logo vi que não vinhas.
Andas por aí a passear para um lado e para o outro, no meio de garotos, amigos e velhos como eu e depois tens de parar…porque tu não paras se não for assim… – E começa a chorar antes de continuar e quase me põe a chorar a mim também – Liga-me sábado à 1h que eu vou ter o telefone comigo. Agora quando é que vens? E agora que vai ser de mim? Questiona antes de parar de falar… a soluçar…
Digo-lhe que são só uns dias e tento brincar dizendo que me aproveito de todas as ocasiões para ficar em casa e ele tenta sorrir enquanto se levanta para ir buscar o telemóvel e me pede para lhe ensinar outra vez como funciona.
Olho para aquele rosto cansado e triste e prefiro mil vezes quando está a refilar e a dizer que não digo nem faço nada de jeito.
Penso no dia anterior… Fui com ele levantar a reforma e parecia uma criança travessa quando percebeu onde abria e fechava o vidro do carro e passou o caminho todo a fazê-lo e a rir.
Ao vê-lo assim sinto mesmo que cada segundo conta dada a velocidade com que as coisas mudam.
Este é o Sr. Zé… que vive este coronavírus (e outros com um nome diferente) com o coração.
Deixei-o em lágrimas… e eu não chorei na frente dele, mas chorei depois…
Chorei pela sensação de impotência que situações como esta ou outras me provocam.
Está preocupado mas não é com ele… já viveu e sabe que mais dia, menos dia pela ordem natural das coisas chega-se a hora.
Está preocupado comigo e com todos os que como eu não param e não sabem o que andam a fazer com a falta de tempo que têm, porque quando o têm percebem que é tempo a mais e não sabem como vivê-lo.
Pior que o coronavírus, são os “coronamentes”…
Sinceramente espero que esta sensação de impotência nos sirva para sermos mais em tudo o que faz sentido para nós… sem esquecermos os outros… e no fim fiquemos melhor(es)
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