Rugas de Sorrisos

Formas de lidar com o covid-19, cuidando de si e dos seus!

Envelhecimento, Demência & Cuidar

Este mês escrevo sobre um tema muito especial para mim, no qual contribuo e luto todos os dias para acrescentar ainda mais ao que já foi feito - a Qualidade de Vida da Pessoa Idosa. Foi o tema de investigação da minha dissertação de mestrado em Reabilitação Psicomotora, que já mereceu lugar de destaque como um dos melhores artigos no Congresso Nacional de Psicologia e Saúde, realizado no mês de janeiro de 2020, na Covilhã.

Bom mês de maio a tod@s

Prometo que não os vou sobrecarregar com as 100 páginas de leitura sobre “A Qualidade de Vida da Pessoa Idosa com e sem Demência: a fiabilidade interrespondente”.

Serão apenas algumas breves e curtas reflexões sobre o tema (tão extenso e interessante).

Mas antes, quero falar-lhes da Senhora A.

 

Conheci a Srª. A em setembro de 2017.

Ao primeiro contacto era uma senhora com expressões fechadas e segundo as auxiliares, uma senhora altamente agressiva e perigosa.

No meu primeiro dia, com uma abordagem de proximidade, sorridente e direta com cada pessoa existente numa sala limpa e agradável, recebi uns arranhões da sua parte. De facto, a Srª. Arminda foi agressiva comigo. Mal me aproximei e a sua mão disparou na minha direção. Ela protegeu-se, como se eu lhe fosse fazer mal, quando foi apenas o primeiro “boa-tarde”.

 

A mensagem recebida, por parte da maioria da equipa foi “muito cuidado com ela! Não lhe podemos dar nada para as mãos! Lápis é para esquecer!”.

Estas informações inquietaram-me um pouco. Não sou capaz de acreditar no que não vejo, nem de desistir à primeira. Não ignorei a informação, de todo, até porque os comportamentos de agressividade eram reais. Mas eu não desisti. Nem deixei que a equipa com quem tinha iniciado um trabalho desistisse. Como? Por tentativas.

 

A cada novo dia, o “boa-tarde” era dito a sorrir. Sempre com alguma distância de segurança, para evitar mais cicatrizes no meu braço, mas ao mesmo tempo, procurando forma de me aproximar.

A cada novo dia, levámos a Senhora A.  para a mesa de atividades, como todas as outras pessoas daquela sala. Na maioria das vezes, conseguia ficar apenas 5 a 10 minutos. A sua agressividade começou a transparecer na força com que partia os lápis e na forma como rasgava e machucava as folhas.

 

Vários dias passaram. A cada novo dia a equipa estava unida a não desistir.

Até que chegou um dia em que um “boa tarde” teve retorno, em que o sorriso foi recíproco. E nesse dia, nesse mesmo momento permaneci por mais tempo ao seu lado. Não podia desperdiçar o tesouro que tinha acabado de encontrar, numa pessoa, que à minha chegada, ninguém acreditava ser possível voltar a ouvir a sua voz.

Depois desse dia, a Senhora A. comunicava verbalmente, voltou a pintar, a escrever, a ler e até a aprender crochê!

 

Esta é mais uma das minhas pequenas (grandes) histórias.

 

Acredito que também tenha uma similar. Mas sabia que o envelhecimento difere de pessoa para pessoa?

A perceção individual da pessoa idosa sobre a sua própria vida, providencia informações relevantes e fundamentais na avaliação das necessidades e dos apoios.

Ou seja, a qualidade de relação entre o seu familiar e o contexto onde ele se encontra é crucial na ponderação de barreiras e facilitadores à sua participação social e funcionalidade. Repare na história de sucesso da Senhora A!

 

É importante que em qualquer ato de cuidar valorize os interesses do seu familiar.

Identificar e compreender o que pode determinar uma vida com mais qualidade é o primeiro grande passo. Como? Através da compreensão das caraterísticas pessoais do seu familiar (como qualidade e defeitos), do desenvolvimento social (como a educação e emprego, que ele exerceu ao longo da vida); da participação em atividades (no trabalho, de lazer), das suas atitudes e crenças, da sua rede de apoio de família e amigos, e do ambiente/contexto onde se encontra.

 

Ser cuidador é um desafio de vários tamanhos: ser cuidador pode ser amar incondicionalmente ou esgotar todas as forças.

 

é um dom que já nasce connosco que faz com que dêmos tudo por tudo pela outra pessoa” – G.

 

é muito difícil e penso em deixá-la

– M.

 

Independentemente da sua vocação, força e coragem, precisa de olhar para o seu familiar SEMPRE enquanto pessoa.

Uma comunicação eficaz é a chave de sucesso para identificar e compreender sintomas (comportamentais). Recorde a história do mês de abril, das conquistas com a D.Aida.

A Psicomotricidade dirigida à Pessoa Idosa (Gerontopsicomotricidade), poderá dar um grande contributo neste sentido, através da sua abordagem holística e centrada na pessoa, promovendo estratégias facilitadoras de comunicação entre si e o seu familiar, nos seus diversos contextos. Esta terapia valoriza sempre a funcionalidade, a autonomia e participação social da pessoa idosa, garantindo ao seu familiar os seus direitos, poder de decisão e a sua participação ativa na vida comunitária.

 A Associação Rugas de Sorrisos tem uma equipa maravilhosa que estará consigo numa caminhada que não precisa de ser só sua, só vossa. Um caminho que pode, também, ser nosso, por um Envelhecimento Digno.

Ana Silvano | Psicomotricista

mentoriapsicomotriz@gmail.com